Caros brasileiros, Confesso: eu gostei muito da novela Avenida Brasil.
É fantástico! Acompanhei essa novela daqui da Alemanha. Não eram só as
maldades da Carminha que me fascinavam. Era também a autoestima
crescente das pessoas que moravam nos subúrbios. Era o clima de ascensão
social num Brasil de mudança e esperança que reinava em 2012. A novela atual O outro lado do paraíso atinge quase o mesmo nível de sucesso de Avenida Brasil.
O sucesso extraordinário dessas novelas me chamou a atenção para um
fato que é tão óbvio que não se questiona mais: o poder da Globo. A
emissora virou o DNA do Brasil, ela define a rotina diária de milhões de
brasileiros, as novelas dela param o país, e com a cobertura política,
ela decide até eleições. Confesso também: essa onipresença e cobertura me perturbam. Cancelei a minha assinatura online do jornal O Globo
e da TV Globo Internacional. Numa época de polarização política, senti
saudade de uma abordagem mais neutra, ampla e equilibrada. Mas eu sei,
mesmo assim, a Globo vai continuar me acompanhando. Em cada ano
de eleição, fico me perguntando, se a onipotência da Globo poderia virar
tema de campanha eleitoral, mas parece que essa expectativa é irreal.
Qual político brasileiro teria a coragem de propor mudanças que
diminuíssem o poder da maior rede de televisão do Brasil e da segunda
maior emissora de televisão do mundo? Concentração na mídia não é
um fenômeno brasileiro. A mais recente pesquisa da ONG Repórteres sem
Fronteiras revela que, em países do Leste Europeu, a liberdade de
imprensa diminui por causa de controles governamentais e da falta de
pluralidade. Na Alemanha, a luta contra um monopólio privado de
informação começou com o movimento estudantil de 68. Depois da morte do
líder rebelde Rudi Dutschke, a raiva sobre o "império da Axel Spinger"
explodiu. Milhares de estudantes tentaram invadir os prédios do grupo em
Berlim, convencidos de que a cobertura critica sobre o movimento havia
contribuído pela morte de Dutschke. A revolta se dirigia especialmente ao carro-chefe da editora, o tabloide Bild.
As manchetes sensacionalistas, o populismo e o conservadorismo do maior
jornal da Alemanha eram considerados instrumento poderoso de
manipulação política. O movimento estudantil não conseguiu a tão
desejada desapropriação, mas abriu o caminho para a fundação de um novo
jornal da esquerda, chamado taz. O Bild
continua forte, ainda é o jornal com a maior tiragem no país e na
internet, o registro bild.de é procurado por 12 milhões de usuários. Mas
mesmo com tanto poder, o grupo Axel Springer não chega nem perto da
Globo. E quando tentou assumir o controle majoritário de um canal de
televisão privado em 2005, foi barrado pela comissão nacional de
controle sobre concentração midiática na Alemanha. No Brasil,
isso provavelmente não teria acontecido. Ainda é permitido que um mesmo
grupo econômico controle emissoras de televisão, rádio e jornais numa
mesma região. Nem as chamadas mídias digitais conseguiram criar uma
alternativa à predominância do grupo Globo. Só para prevenir
mal-entendidos: a Globo é fantástica! Tem ótimos repórteres e editores,
tem ótimos programas e novelas. Mas precisa ter uma concorrência
verdadeira. O Brasil merece mais pluralismo e mais players na sua mídia. Existem
instrumentos governamentais para incentivar esse desenvolvimento.
Existem instrumentos governamentais para acabar com monopólios privados
que causam desequilíbrios no mercado. Uma oferta maior seria um serviço à
sociedade brasileira e à democracia no país. Pois a liberdade de
imprensa é fantástica!
conteúdo
Astrid Prange
DW Astrid Prange de Oliveira foi para o Rio de Janeiro solteira. De lá, escreveu por oito anos para o diário taz de
Berlim e outros jornais e rádios. Voltou à Alemanha com uma família
carioca e, por isso, considera o Rio sua segunda casa. Hoje ela escreve
sobre o Brasil e a América Latina para a Deutsche Welle. Siga a
jornalista no Twitter: @aposylt.
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