A mudança na redação da lei é sutil e a discussão, bizantina, mas o simbolismo é forte: a França quer proteger a escola da onipresença das telas. A Assembleia Nacional adotou nesta quinta-feira uma emenda
para proibir nas salas de aula, no pátio e nas atividades
extracurriculares o uso de telefones celulares
a partir do próximo ano letivo. A proibição se aplica às escolas do
nível fundamental (primário e intermediário), até os 15 anos, e não
inclui o ensino médio. Deixa margem a cada estabelecimento para regular a
aplicação da norma: onde guardar os telefones (em um armário ou na
carteira escolar) ou como punir os que desobedecerem. E permite exceções
para o uso pedagógico dos aparelhos. A lei responde a uma promessa eleitoral do presidente Emmanuel Macron.
Traduz na prática a filosofia educativa do ministro da área,
Jean-Michel Blanquer, partidário do regresso aos fundamentos
tradicionais e convencido de que a sala de aula é “uma pequena
república, onde se aprende a escutar, a entender um ao outro, a cooperar
e saber o que está em jogo na vida coletiva”, como escreve em seu
último livro, Construisons Ensemble L’École de la Confiance (Construamos juntos a escola da confiança, sem tradução no Brasil). A lei, que ainda depende de votação no Senado, foi aprovada com os
votos da maioria presidencial. A proposta consiste em modificar o artigo
515 do Código da Educação, adotado em 2010. O texto original dizia:
“Nas escolas maternais, nas escolas elementares e nos colégios, a
utilização durante a atividade de ensino e nos lugares previstos pelo
regulamento interno, por parte de um aluno, de um telefone celular está
proibida”. O novo texto corrige: “Com exceção dos locais onde, nas
condições em que for preciso, o regulamento interno o autorize
expressamente, o uso de um telefone celular por parte de um aluno está
proibido nas escolas maternais, nas escolas elementares e nos colégios”. Captar a diferença entre as duas leis exige um desses exercícios de
análise de texto que constituem um código de identidade do sistema
educacional francês. Segundo a oposição, a lei é uma “operação de
comunicação”, pura gestualidade política sem efeitos tangíveis. A metade
das unidades já aplicava a proibição. A maioria presidencial argumenta
que o novo texto fornece uma base jurídica mais sólida para enfrentar um
problema que a legislação atual deixou sem resolver. Um total de 93%
dos menores entre 12 e 17 anos na França tem telefone celular. Os
legisladores alegam que os celulares favorecem o assédio na Internet
e expõem os alunos a imagens de violência e pornografia, além de
reduzirem a concentração. O problema, acrescentam, não é apenas sua
presença nas classes, mas no pátio, onde “pode se tornar nefasto ao
reduzir a atividade física e limitar as interações sociais entre os
alunos”. Blanquer
explica em seu livro o objetivo da lei, mais ambiciosa do que o texto
deixa entrever. Trata-se, escreve, de “recuperar o uso razoável do
aparelho [...] e propor a nossos filhos uma experiência de vida na qual a
tela não seja o centro”. A lição vale para os alunos e para os adultos.
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