O interesse dos russos pelo futebol parece ofuscar tudo atualmente,
até a preocupação com uma polêmica e drástica reforma da Previdência. É o
que mostra um estudo recente do centro de análises Levada, uma ONG
russa independente de pesquisas sociológicas e de opinião. O
entusiasmo é compreensível: inesperadamente, a seleção russa conseguiu
chegar às quartas d -final da Copa do Mundo. Só então foi eliminada pela
Croácia. Mas até mesmo a eliminação da chamada "Sbornaia" não acabou
com a empolgação dos torcedores russos. Em vez de frustração, o país se
mostra grato aos jogadores que deram tudo para fazer do torneio um conto
de fadas. Porém, a Copa acabará no domingo (15/07). Os
torcedores estrangeiros voltarão para casa, e os russos retornarão ao
cotidiano, priorizando novamente as odiadas reformas do próprio governo,
que ameaçam reduzir ainda mais o já decrescente bem-estar dos cidadãos. Ninguém
espera um crescimento especial da economia russa em 2018. A previsão do
ministério russo da Economia para o período foi reduzida de 2,2% para
1,9% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2019, a economia deverá
crescer ainda mais lentamente: o prognóstico oficial prevê apenas cerca
de 1,4%. Um dos motivos mais evidentes para isso é o aumento do IVA
(Imposto sobre o Valor Agregado, uma tributação sobre o consumo). A
alta deverá valer a partir de 1º de janeiro de 2019. O Parlamento russo
aprovou o projeto de lei do governo na primeira sessão. De acordo com o
projeto, o imposto deverá subir de 18% para 20% sobre o preço de
mercadorias e serviços. Mas a conta da Copa será ainda mais
longa. Exatamente no dia da abertura do torneio, o governo russo
anunciou mais encargos financeiros para os cidadãos e que aumentaria a
idade da aposentadoria de 60 para 65 anos para homens e de 55 para 63
anos para as mulheres. O plano é pouco detalhado: esse aumento deverá
ser gradual e acontecerá entre 2019 e 2028 para os homens e até 2034
para as mulheres. Tido como liberal, o presidente do Tribunal de
Contas russo, Alexei Kudrin, é um dos defensores dos planos de reforma.
Segundo seus cálculos, o aumento da idade para a aposentadoria poderia
inundar os cofres do governo com 100 bilhões de rublos (1,3 bilhão de
euros) por ano até 2024. O ministro do Trabalho, Maksim Topilin,
promete que parte desse dinheiro deverá ser convertido para aumentar as
remunerações da aposentadoria. Atualmente, a aposentadoria média na
Rússia é de cerca de 200 euros mensais. Os planos do governo não
foram recebidos com entusiasmo e fizeram com que as taxas de aprovação
do presidente Vladimir Putin e de outros políticos na liderança do país
caíssem. Também por isso espera-se que a reforma previdenciária seja
amenizada durante a avaliação pelos legisladores. Provavelmente, o
aumento da aposentadoria e do imposto sobre o consumo também teriam
sido aprovados sem a realização da Copa. Mas, na situação atual, a
população russa deverá sentir os efeitos dos encargos financeiros
adicionais a partir de já. É que eles já precisam pagar bem mais
pela obtenção de documentos federais. Em vez de 50 euros, um passaporte
passou a custar cerca de 70 euros. Há pouco tempo, a carteira de
motorista custava menos de 30 euros. Agora, custa mais de 40. No
país, as despesas como água, eletricidade e administração do lixo, que
são cobradas de forma central pelas grandes empresas (antigamente
estatais), também aumentaram, em média, 4%. Talvez uma forma de
compensar os custos da Copa do Mundo mais cara da histórica: segundo o
próprio governo, gastou-se mais de 680 bilhões de rublos (quase 10
bilhões de euros). O valor está relacionado a gastos diretos com o
evento – como a construção de dez estádios – e não leva em conta muitos
dos gastos com infraestrutura, como linhas de transporte expresso que
beneficiaram mais os turistas do que os próprios russos.
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