Desde a eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos,
no fim de 2016, o uso de notícias falsas em redes sociais para manipular
a opinião pública tornou-se uma preocupação em diversos países,
incluindo o Brasil. Com a proximidade do pleito presidencial de outubro,
há no Congresso diversos projetos de lei para coibir essa prática. Além das chamadas fake news,
robôs ou bots também têm sido utilizados para tentar influenciar
eleições. São programas de computador que realizam tarefas
automatizadas, como seguir perfis de candidatos e compartilhar conteúdos
em redes sociais para que pareçam mais populares. Os principais
líderes da disputa presidencial brasileira possuem entre seus seguidores
no Twitter milhares de bots, segundo um levantamento da ONG
InternetLab. Tanto notícias falsas quanto bots prosperam ao explorar a
polarização social para fins eleitorais, destacam especialistas. "Quando
recebemos informações sobre as divisões da sociedade, isso alimenta
nossos vieses de confirmação e crenças pré-existentes. Eles [bots e fake news]
exploram essa parte da natureza humana", explica Samantha Bradshaw,
pesquisadora do Projeto de Propaganda Computacional da Universidade de
Oxford, grupo que investiga como algoritmos e automação são utilizados
nas redes sociais para manipular a população. De acordo com
pesquisa da agência We Are Social, 87,7% dos brasileiros são usuários
ativos de redes sociais no Brasil e podem ser expostos a notícias falsas
e bots. Atores escusos apostam na frustração de parte da população com o
establishment para ganhar terreno. "Penso nessa batalha
como uma luta global entre democracia e autocracia. A democracia é uma
escolha melhor, mas em todos os países há elementos antidemocráticos com
os quais as pessoas estão justificadamente irritadas. E isso pode ser
explorado", afirma Nick Monaco, pesquisador em desinformação no
Laboratório de Inteligência Digital do Instituto para o Futuro (EUA) e
no Projeto de Propaganda Computacional, além de ex-integrante do Jigsaw,
think tank do Google. Combate a notícias falsas Para combater as fake news,
o Facebook fez parcerias com agências de checagem de fatos em 14
países, incluindo Brasil, Estados Unidos e México. Essas agências
verificam conteúdo suspeito e são certificadas pela International
Fact-Checking Network (IFCN), uma organização apartidária que garante
imparcialidade e transparência dos verificadores. A iniciativa do Facebook já ajudou a reduzir o alcance orgânico de fake news
na plataforma em até 80%. O Brasil, contudo, foi o único país a
registrar ação virulenta contra a medida. Grupos que se autodenominam
liberais e de direita atacaram profissionais das agências Lupa e Aos
Fatos, parceiros da rede social, acusando-os de serem "esquerdistas". "Lidar
com notícias falsas é complexo, porque é difícil dizer objetivamente o
que é verdadeiro. É claro que existem fatos, mas quando se trata de
política, as coisas são muito polarizadas, e muitos valores são usados
para tomar decisões sobre a democracia", argumenta Bradshaw. Há,
entretanto, formas de combater a desinformação sem retirar conteúdos do
ar, como educar usuários e fornecer mais informações sobre anunciantes. "Tem
ocorrido uma grande pressão para publicidade transparente em
plataformas políticas, o que é simples de implementar. Se soubéssemos
que um anúncio no Facebook foi pago por uma organização, isso faria com
que questionássemos quem o financia e suas motivações", diz Monaco. O impacto dos bots No
passado, políticos utilizavam bots para ganhar mais seguidores e
espalhar seus conteúdos. Atualmente, os robôs têm funções mais
manipuladoras. "Bots podem amplificar algo para abafar certas
vozes ou debates, além de espalhar mensagens para colocá-las entre as
tendências e em melhor posição em buscas do Google. Eles ajudam a burlar
o sistema", diz Bradshaw. Bots têm ainda sido usados para atacar
opositores ou jornalistas, com a intenção de silenciá-los e de criar a
percepção de legitimidade pública às agressões. "Vemos isso muito na Turquia, com campanhas de trolling patrocinadas/endossadas pelo Estado contra jornalistas, incluindo ameaças de morte e estupro feitas por bots", afirma Monaco. O México é um exemplo de onde bots suprimem o debate. "A partir de 2012, trending
hashtags foram empurradas para fora dos assuntos do momento por bots,
para frustrar a organização política. Esse é um exemplo poderoso de
supressão de dissenso, de protestos e de liberdade de expressão por meio
da automação", aponta Monaco. No contexto de eleições, os bots
semeiam confusão e "envenenam" hashtags populares, tornando-as menos
relevantes, por exemplo, ao tuitá-las com fotos de gatos. Embora
um estudo do Massachusetts Institute of Technology (MIT) indique que
humanos divulgam notícias falsas no Twitter de forma muito mais rápida
do que bots, esses robôs também espalham fake news. "Alguns
bots tentam entrar em redes de pessoas reais para serem vistos como
usuários legítimos. Eles não vão retuitar algo 100 vezes, mas enviam
estrategicamente notícias falsas que acabam compartilhadas por humanos. É
quando os bots são realmente efetivos, pois conseguiram que uma pessoa
lesse a história ao invés de apenas compartilhá-la em sua própria rede
isolada de bots", conclui Bradshaw. O Twitter já fez mudanças
para limitar o impacto de notícias falsas e bots. A empresa proibiu a
divulgação de conteúdo idêntico por várias contas do TweetDeck, um
aplicativo para gerenciar tuítes, além de vir removendo contas
suspeitas. "Gostaria de ver o Twitter tornando bots
transparentes, marcando-os com um pequeno bot emoji. Isso não seria
difícil e teria benefícios tangíveis", afirma Monaco. "Se você visse que
algo foi retuitado por 10 mil bots e três humanos, seria mais crítico."
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