Na esteira do #EleNão, eleitorado feminino impõe "trava" em crescimento de Bolsonaro



O eleitorado feminino, que representa a maioria dos 147,3 milhões de brasileiros aptos a votar, tem imposto uma espécie de trava no crescimento das intenções de voto do polêmico candidato do PSL, Jair Bolsonaro, ao mesmo tempo em que manifestações encampadas por mulheres contra o presidenciável começaram a tomar corpo na reta final do primeiro turno.

Bolsonaro se envolveu em discussões públicas com mulheres e declarações do líder das pesquisas têm dividido opiniões e alimentado movimento contrários e em apoio ao candidato por parte do eleitorado feminino.
Numa onda semelhante ao “#MeToo”, em que mulheres cobram punições a autores de assédio e direitos iguais aos dos homens, grupos em redes sociais com milhões de seguidores começaram a pregar o “#EleNão”, voto contra Bolsonaro nas eleições. Artistas, como a cantora Daniela Mercury e a atriz Claudia Raia, também aderiram ao movimento.
Neste fim de semana, estão previstos passeatas e atos em protesto ao presidenciável do PSL em várias cidades brasileiros e também fora do país. Adversários de Bolsonaro também têm explorado essas polêmicas do candidato a fim de pregar o voto das mulheres contra ele.
Os dados das pesquisas de intenção de voto ao Palácio do Planalto têm mostrado uma significativa discrepância entre o voto do eleitorado masculino e o feminino no candidato do PSL.
Números da pesquisa Ibope divulgada na terça-feira apontam essa diferença. Naquela sondagem, na simulação de primeiro turno pegando o eleitorado total, Bolsonaro registrou 28 por cento das intenções de voto contra 22 por cento do segundo colocado, o petista Fernando Haddad. Se for levado em consideração apenas o voto masculino, o candidato do PSL teria 35 por cento de votos e Haddad, permaneceria com os 22 por cento. Mas entre as mulheres, os dois ficam empatados tecnicamente em 21 pontos percentuais cada.
A pesquisa indica também que o candidato do PSL é derrotado com folga, quando se leva em consideração apenas o voto feminino, em todas as quatro simulações para o segundo turno —além de Haddad, Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede) e Geraldo Alckmin (PSDB).
O presidenciável —também líder na rejeição do eleitorado, com 46 por cento— registra 54 por cento entre o eleitorado feminino que diz não votar nele de jeito nenhum. A título de comparação, entre os homens, esse índice cai para 37 por cento.
Números de diversas pesquisas indicam que, não fosse o voto feminino, Bolsonaro estaria mais próximo de se eleger no primeiro turno.

RESPOSTA

Segundo a professora da escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Direito Rio, Lígia Fabris, o nível de rejeição do eleitorado feminino a Bolsonaro é uma resposta direta às posições do candidato.
Para ela, suas colocações e atitudes ofenderam essa parcela do eleitorado a tal ponto que provocou um movimento de reação “singular”.
“É algo inédito alguém que tenha uma rejeição tão expressiva entre as mulheres”, disse a professora à Reuters, autora de estudos relacionados às mulheres.
Bolsonaro responde a dois processos no Supremo Tribunal Federal pelo episódio em que, em 2014, disse que não estupraria a deputada Maria do Rosário (PT-RS) porque ela “não mereceria”. Na defesa dos casos, ele alega o direito do deputado a se manifestar livremente e que não houve aumento do crime de estupro em razão da sua fala.
O presidenciável também já disse que mulher deve ganhar menos do que os homens porque ela engravida —na campanha, numa tentativa de remediar a declaração, ele já disse que vai se empenhar para mudar essa realidade.
O vice da chapa de Bolsonaro, general Hamilton Mourão, também recentemente causou desconforto ao afirmar que, em áreas carentes, famílias que tenham apenas mãe e avó podem levar a uma fábrica de desajustados que tendem a ingressar em quadrilhas ligadas ao tráfico de drogas. Por essa e outras declarações, foi ordenado ao vice falar menos até a reta final da campanha.
“Tem um comportamento muito expressivo de quase metade do eleitorado feminino que diz que não votaria de jeito nenhum neste candidato”, afirmou a professora da FGV, lembrando que as mulheres representam mais da metade dos eleitores do país —são 52,5 por cento de quem está apto a votar em outubro.
Também são as mulheres, aliás, que integram boa parcela dos que ainda se declaram indecisos na disputa presidencial daqui a poucos dias. Isso confere ao segmento, explica a professora, a possibilidade de influenciar no resultado das urnas.
Da mesma forma, avalia a professora da FGV, o posicionamento de artistas e formadores de opinião, assim como as manifestações previstas para o sábado, podem ajudar a sensibilizar e criar empatia em outras pessoas, mesmo que não se encaixem nos grupos preferencialmente abordados pelos comentários do presidenciável.
“Essa conjunção de elementos, de posicionamentos, pode ser ainda mais expressiva em relação a essas eleições”, disse a professora Lígia Fabris.

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Ricardo Brito
Maria Carolina Marcello
Reuters

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