Poucos dias separam os brasileiros do primeiro turno das eleições. O
cenário já parece indicar quem serão os candidatos à Presidência que
devem passar para a segunda rodada: Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando
Haddad (PT), que concorre como substituto do ex-presidente Lula, que
permanece preso. No início do ano, esse cenário foi raramente
considerado em previsões. Mas esta acabou sendo uma campanha marcada
pela refutação de vários exercícios de futurologia. A candidatura
de Bolsonaro até agora não deu sinais de desidratação, apesar de sua
estrutura de campanha, pequena em comparação aos principais rivais, e de
sua rejeição recorde, especialmente entre as mulheres. Seu eleitorado
segue como o mais consolidado entre todos os candidatos: ele registra
24% das intenções de voto na pesquisa espontânea, e 55% dos seus
eleitores afirmam que não pretendem mudar de opinião. Já a
transferência de votos do ex-presidente Lula para Haddad acabou sendo
mais veloz e menos desafiadora do que indicavam especialistas. Na região Nordeste,
um reduto petista, a preferência pelo ex-prefeito de São Paulo chega a
30% do eleitorado. E a candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB) não decolou
por enquanto, apesar do seu enorme tempo de TV e amplo leque de
alianças. No Datafolha
de sexta-feira passada (28/09), Jair Bolsonaro (PSL) aparece isolado
com 28% das intenções no levantamento estimulado, embora estagnado em
relação à penúltima pesquisa do instituto. Já Haddad vem registrando
crescimento constante, e chegou a 22% das intenções de voto. Alckmin
permanece com 10%. São números que indicam uma nova forma de polarização
no país: não mais a tradicional entre o PSDB e o PT, mas entre forças
antipetistas que convergiram para Bolsonaro e a influência eleitoral do
ex-presidente Lula. Com a estagnação de Alckmin, que aparece por
enquanto em quarto lugar nas pesquisas, esta pode ser a primeira vez
desde 2002 que o PSDB não vai conseguir chegar ao segundo turno das
eleições presidenciais. O cenário ainda aponta uma polarização
combinada com fragmentação. Nunca desde as eleições de 1989, que
marcaram a volta do voto direto para presidente, os dois líderes da
disputa reuniram tão poucos votos a uma semana da disputa. Juntos,
Bolsonaro e Haddad conseguiram atrair por enquanto cerca de 50% dos
eleitores. A outra metade ainda manifesta preferência por outros
candidatos, está indecisa ou pretende votar em branco ou nulo. Em 2014, a
uma semana do primeiro turno, 65% dos eleitores apontavam preferência
pelos dois líderes na disputa. São esses os números que ainda
motivam os candidatos que se apresentam como alternativa a Bolsonaro e
Haddad. Atrás nas pesquisas, eles vêm reforçando o discurso que tenta
romper com a polarização entre as candidaturas do militar reformado e o
ex-ministro petista. No penúltimo debate entre os
presidenciáveis, Ciro Gomes (PDT), Alckmin e Marina Silva (Rede)
distribuíram críticas tanto para Haddad quanto Bolsonaro. Marina, por
exemplo, disse que "Haddad e Bolsonaro são cabos eleitorais um do
outro". A campanha de Alckmin também vem insistindo na tese que um voto
para Bolsonaro é um voto para o PT, citando os cenários de segundo turno
que apontam que o petista derrotaria o ex-capitão. Nas últimas
pesquisas, tanto Ciro, Alckmin e Marina aparecem estagnados ou em
tendência de queda. Nas eleições de 2014, ainda houve espaço para
uma virada de última hora: a ex-ministra Marina Silva (então no PSB)
começou a semana em segundo lugar, cinco pontos percentuais à frente do
tucano Aécio Neves (PSDB). Em poucos dias, no entanto, o tucano acabou
sendo beneficiado por uma onda de voto útil e passou para o segundo
turno. "Entramos nos dias da decisão definitiva. Em 2014, 23%
decidiram na última semana. Entre os que escolhem algum candidato, há
34% que ainda podem mudar. Na espontânea, são 25% sem candidato",
afirmou o diretor do Datafolha, Mauro Paulino. Segundo a última
pesquisa Ibope, há espaço para mudanças no quadro especialmente entre as
mulheres e os eleitores mais jovens, que aparecem entre os grupos mais
propensos a rever o voto. O levantamento estimou que 55% do
eleitorado feminino não tem candidato absolutamente definido. Já 65% dos
eleitores de 16 a 24 anos apontam que ainda podem mudar de voto. Para o
Ibope, o número de eleitores que seguem sem candidato fechado de forma
convicta chega a 38%. "Esse contingente pode mudar muita coisa",
disse a diretora-executiva do Ibope, Márcia Cavallari, ao Jornal do
Brasil. Ela, no entanto, aponta que o cenário mais provável no momento é
mesmo de um segundo turno entre Bolsonaro e Haddad. Nesta segunda-feira (01/10), o Ibope deve divulgar mais uma pesquisa presidencial. Na terça-feira, será a vez do Datafolha. Mesmo
que não ocorram surpresas de última hora, o cenário a uma semana das
eleições já resultou em uma série acontecimentos inéditos na história
dos pleitos presidenciais pós-redemocratização. Nunca, por exemplo, um
líder nas pesquisas sofreu tanta rejeição entre o eleitorado. Na ponta
dos levantamentos de intenção de voto, Bolsonaro é rejeitado por 46% do
eleitorado. Antes dele, a maior rejeição entre os principais
candidatos que dominavam as pesquisas havia sido registrada pelo
ex-presidente Lula em 1994. Na ocasião, o petista viu sua popularidade
se esfarelar por ter se posicionado contra o Plano Real. Ele registrou
40% de rejeição a poucos dias do primeiro turno. Outro feito inédito de Bolsonaro foi incentivar a maior disparidade de gênero
em torno de uma candidatura competitiva desde a volta das eleições
diretas. Segundo o Ibope, Bolsonaro tem 36% das intenções de voto entre
os homens e 18% entre as mulheres – uma proporção de dois para um. Nem
mesmo em 2014, quando duas mulheres chegaram a liderar a corrida, essa
diferença de gênero foi tão acentuada. O eleitorado de Dilma no primeiro
turno daquele ano era bastante equilibrado: 47% de homens e 53% de
mulheres. E caso chegue ao segundo turno, Bolsonaro terá rompido
com a lógica das coligações partidárias que dominaram os pleitos entre
1989 e 2014. Desde a volta da redemocratização, todos os candidatos que
chegaram à segunda rodada haviam fechado alianças com três ou mais
partidos – ou ao menos com uma legenda de maior expressão. Bolsonaro só
conta com o apoio do inexpressivo PRTB. Já Haddad, se chegar ao
segundo turno, vai ter rompido com todas as tendências registradas nas
eleições pós-1998 que contaram com uma segunda rodada. A um mês e meio
das eleições, ele amargava 5% no Datafolha. Nos pleitos entre 2002 e
2014, todos os candidatos que chegaram ao segundo turno tinham pelo
menos 15% das intenções 45 dias antes do pleito. Quanto a
Alckmin, se o cenário entre Bolsonaro e Haddad prevalecer, sobrará ao
tucano se juntar ao time de exceções entre os presidenciáveis que
dispunham de maior tempo de TV na campanha. Em apenas duas ocasiões
entre 1989 e 2014, o candidato com maior espaço de propaganda saiu
derrotado na eleição presidencial: 1989 e 2002. Na primeira eleição da
redemocratização, Ulysses Guimarães, que detinha 22 minutos diários na
TV, amargou o sexto lugar na disputa. Já José Serra, que dispunha de 41%
do espaço em 2002 – quase o dobro de Lula –, pelo menos chegou ao
segundo turno.
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