Mulheres também eram escribas de elite, revela arcada dentária medieval



Durante a Idade Média, a abertura de rotas comerciais com a Ásia introduziu diversos produtos exóticos na Europa. O pigmento “ultramarino”, um pó brilhante azul produzido a partir de pedra lápis-lazúli (encontrada em minas do atual Afeganistão), foi um deles. Era algo tão raro e caro que valia tanto quanto o ouro. Usado para ilustrar luxuosos manuscritos medievais, apenas os escribas mais importantes tinham acesso ao pigmento.

Os escribas, diga-se, formavam a elite intelectual de sua época. Eram eles, afinal que escreviam os livros (a prensa de tipos móveis não existia), e uma obra feita à mão em pergaminho com lápis-lazúli podia custar tanto quanto uma casa.
A novidade aqui, de qualquer forma, é outra. Uma descoberta recente mostrou que essa elite profissional não era formada apenas por homens, como o senso comum levaria a crer. O achado surgiu por acaso: uma equipe chefiada pela arqueóloga Christina Warinner, da Universidade de Zurique, Suíça, estava investigando microrganismos da cavidade bucal de esqueletos antigos. O objetivo era pesquisar a dieta medieval. Um desses esqueletos veio de um cemitério perto de Dalheim, na Alemanha, associado a uma comunidade religiosa feminina — certamente um mosteiro de freiras da época.
A questão é que esse esqueleto, de uma mulher que viveu entre os anos de 1000 e 1100, possuía uma estranha placa mineralizada azul em sua arcada dentária. Depois de uma longa investigação, os arqueólogos constataram que as partículas azuis eram, nada mais nada menos, que o cobiçado lápis-lazúli. São as primeiras evidências diretas do uso do pigmento por uma mulher nessa época.
Ok, mas o que isso significa? Significa que havia mulheres escribas no século 11, e que elas desempenhavam importantes funções na área. Os historiadores há muito presumem que os monges, e não as freiras, eram os principais produtores de livros na Europa medieval. Poucos manuscritos com iluminuras (letras, bordas e ilustrações decoradas) foram assinados, mas aqueles que continham assinaturas eram todos atribuídos a homens.
Achar lápis-lazúli na arcada de uma mulher religiosa, porém, desafia essa suposição: perto do convento de Dalheim, de onde veio o esqueleto, havia um mosteiro de monges escribas. Os historiadores acreditam que a produção de manuscritos de luxo, usando materiais caros (como ouro e o próprio lápis-lazúli), foi terceirizada às vizinhas, mulheres escribas.
“Há um viés generalizado, compartilhado por muitos historiadores, de que a produção de livros era feita apenas por homens. Mas, por razões de submissão, as mulheres tendiam a não assinar suas obras”, disse a arqueóloga Christina Warinner.
O mosteiro de Dalheim foi destruído em um incêndio durante o século 14, deixando escassa evidência de trabalho que suas moradoras poderiam ter feito lá. A manutenção de registros nos mosteiros das mulheres medievais é bem limitada, assim como os manuscritos sobreviventes.
Você pode estar se perguntando: mas como o pigmento de lápis-lazúli acabou na boca dela? Da mesma forma que poderia parar nos dentes de qualquer escriba da época. Eles (e elas) lambiam a ponta dos pincéis para deixar o traço mais firme. Nisso, o pó de lápis-lazúli ia acumulando nos dentes.


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Ingrid Luisa
Super

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