Quem prefere e escolhe pessoas inteligentes para um relacionamento amoroso não deveria ser encarado como novidade nem tema para artigos. Que assim seja, além de provocar certa inquietação, pode ser indicativo de que a inteligência é um bem cada vez mais escasso, menos abundante do que a beleza, o carisma ou a personalidade e, precisamente por isso, é mais valioso.
No entanto, diante da pergunta, "com quem você preferiria
dormir uma noite: com alguém de alto QI ou com alguém com corpo e físico
invejáveis?"
Não temos muita certeza de que a maioria escolheria os
neurônios. É provável que muitos ficassem com os hormônios ou
feromônios. Na melhor das hipóteses, haverá tempo no dia seguinte para
ler Byung-Chul Han.
Os
sapiosexuais, porém, não só admiram a inteligência, mas essa qualidade é
a que mais os excita sexualmente em um potencial parceiro, acima das já
tradicionais e clássicas questões estéticas, monetárias, sociais de
status social ou poder.
Essa atração sempre aconteceu,
mas que não havia sido batizada com nome tão pomposo. Quando muito,
recebia o rótulo de que era excêntrico ou gostava dos bizarros, e em um
segundo a questão estava solucionada. Hoje, no entanto, há vários tipos
de teorias para explicar esse fenômeno "raro". Há testes do Buzzfeed
para detectar se você é sapiosexual e até um portal de encontros, o
Sapio, para que os inteligentes, ou os que erotizam essa qualidade,
encontrem a sua cara metade.
O psicólogo e sexólogo neozelandês John Money
(1921-2006) procurou explicar por que algumas pessoas se sentem
atraídas por um certo tipo de qualidade e não por outras, com sua teoria
sobre o "mapa do amor". Este condiciona nossa atração sexual e não se
trata de um mapa comum, mas um que se desenha em nossa mente e que
constitui uma representação complexa de nosso amante idealizado, do que
consideramos como erótico e das práticas mais estimulantes para nós.
Algo como a personalidade erótica. Este mapa é projetado no imaginário
mental e se expressa em sonhos, fantasias e atos, e cada mapa é único,
embora compartilhe características comuns com o de outros indivíduos.
Segundo Money, os mapas do amor começam
a se formar desde que nascemos, com todas as informações, experiências e
estímulos que recebemos. As experiências da infância deixam uma marca
no nosso mapa do amor e as negativas têm a capacidade de imprimir uma
mancha que pode impedir no futuro a formação de vínculos afetivos e
eróticos harmoniosos.
A história nos deixou famosos
sapiosexuais, como Marilyn Monroe (talvez o papel em que Hollywood a
colocou, o de loira burra, tenha feito com que ela fugisse do padrão de
beleza para se refugiar na massa cinzenta). A atriz uma vez reconheceu
que Albert Einstein era o homem mais sedutor que já havia sido
apresentado a ela e que não hesitou em lhe propor: "Deveríamos ter um
filho juntos para que tivesse meu físico e a sua inteligência". John
Waters aconselhava: "Se você for à casa de alguém e não houver um único
livro, não durma com ele"; e o personagem de Eusebio Poncela, Dante, no
filme Martín (Hache) (1997), defendia que “é preciso foder as mentes”.
A inteligência, a segunda qualidade mais erótica
Na
verdade, somos todos um pouco sapiosexuais. Foi o que revelou um estudo
realizado por Gilles E. Gignac, professor titular da Universidade da
Austrália Ocidental. Foram entrevistados 383 adultos para se conhecer as
características que mais valorizavam em seus parceiros e os resultados
mostraram que a inteligência foi a segunda mais citada —depois da
gentileza e compreensão—, desde que não fosse muito elevada. Assim,
descobriram que a relação entre o quociente intelectual e a atratividade
é curvilínea. Ou seja, atinge o seu pico quando alcança um QI de 120,
mas diminui se já é de 135.
Alguns também apontam que os
sapiosexuais podem relacionar de modo inconsciente a intelectualidade do
outro a uma relação mais segura e estável. De alguma forma, associam a
inteligência a uma boa tomada de decisões e a uma espécie de "seguro"
para o relacionamento.
Como explica Lora Adair, professora de psicologia evolucionista da Universidade de Lyon, na revista Vice,
“homens e mulheres sempre desejaram a inteligência em seus
companheiros, quer se identifiquem como sapiosexuais ou não. Isso
acontece em todas as espécies, embora em animais não humanos a
inteligência ou a capacidade cognitiva seja medida morfologicamente”.
Lyon
dá como exemplo o macho do pássaro-cetim, que constrói ninhos
intrincados adornando-os com objetos brilhantes que encontra em seu
entorno para atrair as fêmeas mais seletivas. "A capacidade de encontrar
esses objetos excepcionais e de protegê-los de roubo ou sabotagem de
outros machos pode servir como um indicador de capacidade cognitiva e de
adequação genética."
Se a inteligência ajudou nossos
ancestrais a resolver problemas e a evoluir, não é estranho que
continuemos a considerá-la uma qualidade que pode nos trazer uma vida
mais tranquila, uma situação econômica melhor e até mesmo um parceiro
mais saudável. Além disso, há outro estudo, realizado pelo psicólogo
evolucionista Geoffrey Miller, da Universidade do Novo México, que
relaciona um alto QI com uma boa qualidade de sêmen, feito entre 400
veteranos da Guerra do Vietnã que foram submetidos a esses dois testes.
“Tradicionalmente,
a ideia é que a atração sexual tem muito a ver com o físico, com o
corporal, com o mental. Mas a atração é algo mais heterogêneo e que
integra muitas coisas: senso de humor, capacidade de compreensão ou a
maneira de expressar o sentimento, e todas essas qualidades têm muito a
ver com inteligência”, diz a psicóloga e sexóloga Gloria Arancibia
Clavel.
Por isso, os sapiosexuais não costumam ser
pessoas de amor à primeira vista nem de flechadas, já que descobrir se
alguém é inteligente ou não leva tempo e, geralmente, seus
relacionamentos começam como uma amizade para desembocar na atração
sexual, à medida que o cérebro se despe. Para este grupo, a sedução
entra mais pela palavra e o ouvido, por meio de conversas ou pontos de
vista interessantes, do que pela visão. Por isso se costuma dizer que as
mulheres são mais sapiosexuais que os homens. "Na verdade, esta é uma
afirmação que se conecta com as questões de gênero e os clichês que
ainda definem homens e mulheres, as dificuldades de alguns homens em
reconhecer uma mulher mais inteligente que eles ou a ideia, de algumas
mulheres, de que para seduzir têm que se fazer um pouco de bobas ou,
pelo menos, não parecer inteligentes demais”, diz Aranciba.
Mas, o que é inteligência?
Claro
que hoje muitos tendem a confundir a inteligência com o acúmulo de
dados (como a capacidade de um disco rígido), a habilidade para se
vender (e, assim, os tímidos passam por tolos) e até a arrogância. Por
muitos anos essa qualidade foi relacionada com a capacidade numérica,
mais do que com outras, o que me fez tocar o limite entre uma pessoa
normal e uma borderline por tirar uma nota baixa em um teste que fizeram na escola para determinar o meu coeficiente intelectual.
Felizmente,
não lhe dei muita importância, ao contrário de outros que se deixaram
influenciar quando os resultados os rotularam de superdotados, para sua
desgraça. Hoje em dia, esses testes não são mais feitos, pois se sabe
que existem muitos tipos de inteligência: a emocional, a social e até a
erótica; embora todas compartilhem características comuns: o senso de
humor, a empatia e, acima de tudo, a capacidade de resolver problemas em
novas situações.
A atração pela inteligência também pode
acarretar certos perigos, observa Gloria Arancibia. “Muita coisa
acontece na observação. Passa-se da admiração à idealização da pessoa, e
daí à dependência. E isso reforça ainda mais a falta de autoestima em
pessoas pouco seguras de si mesmas e pode resultar no domínio daquele
que se supõe mais inteligente sobre o outro.”
A
erotização do neurônio desemboca também em todo um imaginário de
protótipos para os sapiosexuais, em que se destacam o professor/a, os
escritores, os cientistas e, sobretudo, as bibliotecárias, segundo Bix
Warden em seu livro The Sexy Librarian’s Big Book of Erótica. O
bom de se sentir seduzido eroticamente pela inteligência é que esse
tipo de atração não é afetado pela passagem do tempo, nem pelas rugas ou
a flacidez. Pelo contrário, ganha ao longo dos anos. Platão já dizia
que "o amor é como uma escola de graduação que começa com a beleza do
corpo e depois passa para as ideias e para as pessoas que mostram uma
inteligência privilegiada".
conteúdo
El País
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